«Heróis do mar, nobre povo,
Nação valente, imortal
Levantai hoje de novo
O esplendor de Portugal!
Entre as brumas da memória
Ó Pátria, sente-se a voz
Dos teus egrégios avós
Que há-de guiar-te à vitória.
Às armas, às armas,
Sobre a terra, sobre o mar!
Às armas, às armas.
Pela Pátria lutar!
Contra os canhões, marchar, marchar.»
O excerto do nosso hino nacional
que antecede o este romance do António Lobo Antunes poderia facilmente sugerir uma
glorificação a Portugal. Desde os tempos em que o nosso povo se embrulhou com
os britânicos (onde se lê “canhões” lia-se “bretões” na versão original de A Portuguesa), das conquistas asiáticas,
africanas e parte do continente americano, temos uma certa tendência a viver do
passado e não é à toa que temos uma palavra única sem tradução directa no
mundo: a saudade. É isso mesmo, foi pela saudade que Salazar enviou milhares de
inocentes para combater pela extensão territorial da Metrópole, como se sabe,
mas as coisas ainda se complicaram mais quando Portugal decidiu entregar os
territórios africanos e não soube domar essa transição.
Uma família que viveu em Angola e
que se viu obrigada a retornar a Portugal sugere a dificuldade a má gestão
humana e geográfica dos governos portugueses que não protegeram aqueles que se
encontravam a viver em Angola de forma honesta, aqueles que se sentiam
angolanos, aqueles que reconheciam a igualdade a todos os níveis entre o povo
português e o angolano. Mas neste esplendor altamente satírico à pobreza
material e espiritual de um povo que conquistou metade do mundo, há quatro
personagens que vão narrando os acontecimentos desde os primeiros tempos do
domínio salazarista sobre Angola, passando pelo 25 de Abril, guerra civil
angolana e total independência do país, sensivelmente até 1995, data da última
narração neste romance. As personagens são três filhos e uma mãe que oriundos
de uma família que enriqueceu com a exploração dos escravos negros e que construiu
laços e negócios de exportação sólidos com outros grandes países europeus e
norte-americanos.
Dois desses filhos são bastardos
fruto de relações extra-conjugais entre um pai, que aparece a falar ao longo de
alguns capítulos, e uma mãe de uma zona pobre, que decide entregar-lhe a
criança a troco de dinheiro. Numa casa de várias traições amorosas onde o luxo não
suprime a falta de carinho que algumas personagens desabafam, quase todos se
dão mal, especialmente a mãe e Carlos, um mulato desprezado pela própria avó. Os
três filhos são enviados para Portugal sensivelmente quando a guerra civil rebenta
e as milícias angolanas andam a pilhar e destruir o império português, de onde,
como sabemos, os portugueses eram perseguidos. Muito sangue, muita tragédia e
muito saudosismo de personagens que experienciam o auge e o declínio do
salazarismo em Angola.
O Esplendor de Portugal é obviamente um retrato satírico não só do
declínio geográfico e económico, mas também de um povo que vive ainda no
passado e que se lamenta por isso. Apesar de ser um bom livro, as cerca de 412
páginas do livro revelam-se pesadas a determinada altura, caindo facilmente na
repetição de ideias – ainda que esta técnica de “tortura” seja habitual em António
Lobo Antunes.
Fique curioso...
ResponderEliminarLobo Antunes é um dos meus autores preferidos.
Curiosamente comecei por ler os últimos livros de ALA e depois continuei por aqueles que iam sendo publicados... Só ainda li os livros que publicou desde 2000...
ResponderEliminarMas esses foram suficientes para perceber que ele é O ESCRITOR!... Não são apenas romances... É poesia...
Comecei pelos dois primeiros e depois saltei também os os últimos, antes de ler tudo cronologicamente. A verdade é que ALA me espanta sempre :)
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