sábado, 27 de julho de 2013

Ricardo Adolfo «Maria dos Canos Serrados»



Ricardo Adolfo continua a dar cartas no mundo da nova ficção nacional. O autor de Mizé – Antes Galdéria do que Normal e Remediada e Depois de Morrer Aconteceram-me Muitas Coisas apresenta-nos o romance de uma anti heroína de vinte e poucos anos residente na zona da Linha de Sintra.

Maria, uma rapariga que estudou numa faculdade de Lisboa, vê-se no desemprego, com salários em atraso, a partilhar uma casa com uma raparigas da má vida e ardentemente apaixonada por Velhinho, um gigolo profissional que anda pelo Algarve a fazer turistas. Ricardo Adolfo escreve capítulos curtíssimos e em conformidade com a rapidez e o calão que as suas personagens debitam na narração e diálogos, iniciando cada novo capítulo em forma de um diário onde Maria regista os seus pensamentos e sonhos; são sempre dirigidos ao tal Velhinho:

«Velho verme,

Estamos com um ódio canídeo à tua pessoa e ao resto do mundo. Estamos prestes a ir ao Nandos comprar uma fusca que te desfaça a carapinha e o nariz empinado em milhares de bocadinhos pequeninhos».

Perante a corrupção da empresa onde acaba de ser despedida, a inoperância dos sindicatos e a falta de resposta por parte da Segurança Social, Maria vê-se obrigada a safar-se como pode no país do “desenrascanço”. Como distracção, Maria e as amigas vão a Rio de Mouro ao Bar e Salão de Fogo Nandos, um espaço localizado no terceiro andar de um prédio, onde os fregueses podem disparar armas de fogo contra a parede. À medida que a nossa protagonista fica expert na arte de disparar e a sua vida pessoal e mercado de trabalho caminham para o precipício, Maria deseja ardentemente adquirir uma Baikal de canos serrados para entrar no mundo dos criminosos.

Repleto de vernáculo e linguagem popular, esta Maria dos Canos Serrados retrata fielmente a realidade de muitos jovens portugueses que frequentaram o ensino superior sem porém terem argumentos e oportunidades no mercado de trabalho que lhes estava destinado; a corrupção no mundo empresarial português é igualmente visado sob um olhar extremamente irónico, como aliás o autor nos tem habituado.

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