Publicado em 1982, Em Busca do Carneiro Selvagem é a
terceira obra no extenso cardápio do japonês Haruki Murakami em termos
cronológicos, ainda que eu tenha o mau hábito de saltar de romance em romance e
ignorar as datas. Este metafórico romance encerra a trilogia do Rato, composta
por Pinball, 1973 (1979) e Hear the Wind Sing (1980), que
infelizmente para os leitores portugueses, não se encontram traduzidos na nossa
língua.
Dança, Dança, Dança (1988), editado por cá pela Casa das Letras,
não faz parte desta trilogia mas dá continuidade à estória deste romance – está
em lista de espera nas minhas leituras. Comparando em retrospectiva todos os
romances que já li deste senhor, notei um franco aumento qualitativo em relação
à escrita e criação de personagens marcantes, a par do prazer que dá ler
Murakami; aqui neste romance nota-se alguma inexperiência, se assim lhe
pudermos chamar, em relação aos seus romances mais recentes. Dissipo toda e
qualquer dúvida: Em Busca do Carneiro
Selvagem é um bom livro carregado de excelentes ideias… que o escritor
aprimorou nos romances posteriores. Sim, a base da narrativa murakamesca encontra-se
aqui: referências a Franz Kafka, personagens fortes e sóbrias, a literatura, o
jazz, blues e soul norte-americanos, melancolia, adjectivação melódica, e uma
capacidade exemplar de captar a atenção do leitor.
Em termos de estória, Em Busca do Carneiro Selvagem segue uma
narrativa linear e limitada, até; isto é, há muita simplicidade na sinopse do
romance: um jovem que trabalha na indústria da publicidade, e cujo nome nunca
nos é revelado, é interpelado por um senhor que lhe propõe encontrar um
estranho carneiro com uma singular estrela no seu pêlo. Paralelamente, a
personagem principal arranja uma namorada que é modelo de orelhas e que o
ajudará a encontrar o tal carneiro especial. Há quem diga que todos os livros
são auto-biográficos, na medida em que enquanto escritores transpomos sempre
parte de nós para o papel, e talvez seja mesmo verdade: o nascimento e a idade,
assim como o ano em que decorre a acção sugerem que Murakami seja a personagem
principal.
Com uma foto de vários carneiros
numa paisagem verde, o nosso personagem tem assim que descobrir o paradeiro do
invulgar animal. Mas por onde começar? A sua viagem começa em Tóquio e leva-o
até à ilha de Hokkaido, onde descobre o Hotel Golfinho, cujo nome é inspirado
em Moby-Dick, de Herman Melville –
aliás, o dono do hotel é o primeiro a explicar esta curiosidade. Esta referência
ao mundo de Melville reforça-se mais quando a personagem principal revela que o
pénis de uma baleia lhe vem várias vezes à memória. Se o capitão Ahab persegue
uma baleia invulgar, não é menos verdade que a personagem que Murakami criou
neste romance persegue um carneiro também ele único.
Em Busca do Carneiro Selvagem está carregado daquele tipo de
significados subtis que obrigam a ler nas entrelinhas, revelando-se uma óptima
experiência de leitura e imersão no mundo místico de Murakami. No entanto, a
obra não cativa tanto como Norwegian Wood
ou Crónica do Pássaro de Corda, isso
é certo.
Olá Simão,
ResponderEliminarNa minha opinião toda a obra de Murakami leva-nos a ler nas entrelinhas.
É quase certo que mais ano menos ano ele vai ganhar o Nobel, mas se é verdade que gostei de todos os livros que li dele, também o é que ainda não li nenhuma "obra-de-arte" deste autor nipónico. Mas claro, isso é apenas a opinião do leitor que sou.
Olá, Tiago
EliminarAcredito que ele ganhe o Nobel mais cedo ou mais tarde por mérito próprio, mas infelizmente vai ganhar por politiquices: o Japão não pode ficar sem nada depois de a China ter vencido este ano... é um mundo competitivo, o da Literatura.
Qual foi o romance que mais gostaste de Murakami? O meu continua a ser 'Norwegian Wood', fantástico em todos os aspectos.
Não li Norwegian Wood. Gostei bastante de Os Passageiros da Noite. Quando acabei de ler 1Q84 volume1, pensei: é desta que vou ler uma "obra de arte" de Murakami, mas o volume2 é um pouco repetitivo, vamos ver se no volume3 justifica toda aquela repetição.
ResponderEliminarPor acaso disseram-me que 1q84 até nem era nada de outro mundo. Tenho cá, em inglês, para ler em breve.
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