sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Ernesto Sabato «O Túnel»


Visivelmente emocionado e emerso num choro de alegria, Ernesto Sabato abraçou o amigo José Saramago aquando da distinção de honra no III Congreso Internacional da Língua Espanhola em 2004. O escritor, ensaísta e pintor nasceu em 1911 e morreu este ano - a escassos meses de completar um século de vida - vítima de bronquite. Consigo deixou um legado de crónicas, quadros e uma profunda reflexão sobre o valor do Homem e a sua importância enquanto ser consciente e pensador. Entre as suas maiores obras encontra-se este túnel.

O Túnel aborda a vida do pintor famoso, de Buenos Aires, Juan Pablo Castel e toda a sua solidão e crise existencialista. Narrado sempre na primeira pessoa, o livro abre com a confissão de um crime de Castel, que se dirige ao leitor a contar-lhe que assassinou uma mulher. Após pintar um quadro onde figura uma casa à beira-mar e uma mulher espreitando à janela, Castel exibe-o numa casa de artes onde acaba por se aperceber que, para além das habituais figuras que povoam aqueles ambientes - que ele próprio despreza -, se encontra presente uma jovem bela que observa o quadro e o inquieta. A partir daqui, o nosso personagem fica obcecado por esta mulher e decide ir à procura da mesma na baixa da cidade; assim que a vê, o coração de Castel fala mais alto que o seu raciocínio e interpela María Iribarne e confessa-lhe, desesperado, que a deseja ter para si mesmo.

Como em muitos romances existencialistas, as personagens apresentam-se envoltas num clima de depressão profunda e têm dificuldades em exteriorizar os seus sentimentos e, acima de tudo, compreender o que os rodeia, desprezando-os quase sempre. Castel, obviamente perturbado e constantemente a reflectir sobre a sua condição humana, vive no seu mundo, no seu túnel, até que começa a sair e a ter relações com María, acreditando que ela é só sua e que mais ninguém a pode ter. Tal como o seu quadro - um dos pontos mais simbólicos da obra – María encontra-se num quarto que não é o de Castel; este quarto pode ser interpretado como um retiro que o próprio pintor procura e está ligado à casa de praia que a sua amante possui. Mergulhado em constantes desabafos anti-humanidade, Castel julga ver em María a saída do seu túnel, a sua salvação e esperança. 

O Túnel é uma obra de fácil leitura e ao mesmo tempo de lenta digestão. A escrita de Sabato é extremamente densa do ponto de vista psicológico e desoladora em termos humanos, criando personagens que buscam a felicidade quando já há muito que estão condenadas à dor que a solidão causa. A par deste romance, Sabato – o “irmão mais velho” de José Saramago - escreveu mais dois de forte impacto no mundo hispânico e europeu, apesar de ter dedicado grande parte da sua vida à pintura e a ensaios.   

4 comentários:

  1. Terminei a poucos dias o livro; me fez querer ler mais alguma coisa do Sabato, talvez para ter certeza do que eu senti, do que pensei.

    Parabéns pelo blog.

    Abraços

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  2. Bom dia,

    Obrigado pelas suas palavras e continuação de boas leituras.

    Abraço

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  3. Um bom "investigador", com a ajuda do Universo, sempre encontra o que procura!

    Nunca se sabe, o que sabe, quem ao nosso lado se senta.

    As balizas do ser humano podem sofrer golos, podem as palavras definhar: urge estar atento (3 verbos! - parece-me bem).

    Gostei do que li. Ainda Gosto.

    Parabenizo-te pelo Gosto pelas Letras: Arte!

    Abraço,

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