terça-feira, 25 de outubro de 2011

Maria Gabriela Llansol «Na Casa de Julho e Agosto»


Maria Gabriela Llansol foi uma escritora incompreendida, no geral, pela imprensa nacional, autora de obras ímpares, assim como um estilo literário ao qual é difícil identificar um conto, um romance, um livro de memórias, ou ensaios. De ascendência espanhola (daí o apelido Llansol), a escritora nunca se identificou verdadeiramente com um Portugal opressor, nem mesmo após o 25 de Abril; de facto, a escritora passou grande parte da sua vida residindo na Bélgica.

Inserida na trilogia Geografia de Rebeldes, Na Casa de Julho e Agosto é o fecho da mesma, iniciada em O Livro das Comunidades e seguida em A Restante Vida. O título do livro e da trilogia são simbólicos e enigmáticos, a escrita bastante original e a leitura nem sempre é fácil: Llansol escreve da mesma forma que ela sempre se enquadrou no Mundo, através de temática(s) e estilos literários vastos, separados geograficamente (Kafka, Camões, Nietzsche), embutidos de um grande espírito de “comunidade”. Em boa verdade, é difícil entender a autora como uma cidadã portuguesa. É necessário expandir a mente e a alma para se compreender minimamente o legado llansoliano e observar que ela pertencia ao Mundo – numa entrevista a João Mendes, publicada no Público a 18 de Janeiro de 1995 (transcrita na sua totalidade nesta mesma edição da Relógio D'Água), e sobre a questão da sua relação com o país de origem, Llansol foi esclarecedora: «De Portugal conheço o português que é gente e uma língua. Conheço pouca gente, mais paisagens do que gente, e trabalho a língua. Não consigo ser patriota. E muito menos no pensar.».

Na Casa de Julho e Agosto apresenta-se disposto como um bom quebra-cabeças, incrivelmente denso e curto no número de páginas. Dando continuidade aos dois primeiros capítulos da trilogia, a estória é contada por beguinas e personagens da História (umas religiosas, outras do campo das Artes) separadas por séculos, criando um ambiente de exílios e viagens ao largo do Mundo através de rios (Tejo, Eufrates e Tigre) que interligam vários países – aqui uma vez mais a sensação de emancipação e corte da escritora com o Portugal dos anos 60/70/80 – e permitem uma partilha de culturas que o nosso Portugal não permitia na altura em que a trilogia foi escrita; além disso, a emancipação da Mulher parece-me ser um assunto que a escritora aborda.

Não tenho dúvidas ao afirmar que a obra é de uma difícil interpretação – amenizada e simplificada pelo posfácio da autoria de João Barrento. De facto, há que procurar onde não existe, onde a luz não incide, o fio condutor da fragmentação que compõe Na Casa de Julho e Agosto.

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